É o café e o pão pela manhã
É a viagem de familia para Salvador
É uma estrada de terra no fim da cidade
É uma velha amizade, é um novo amor
É um livro de estudos perdido no armário
Da faculdade que não terminou
É uma carta de amor rasgada e assinada
Por alguém que você nunca amou
É uma fita cassete que guarda memórias
Dos amigos de escola do seu avô
Um papel de presente dourado e amassado
De um jantar de natal que já passou
É a casa no fim da rua, Um cadarço amarrado
uma bola de couro, um chaveiro, um olhar
Um vizinho, uma rosa, uma noiva sorrindo na beira do altar
É uma moeda na fonte, uma estrela cadente,
Um cachorro sem dono, um amigo, um parente um pedaço de pão
É sentir o calor da fogueira de uma festa de São João
quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
domingo, 25 de novembro de 2012
Naná,
Ontem, saindo da estação Santa Cecília do metrô, a caminho de
sua casa nova, pensava em duas coisas. Uma delas era você. A outra era a cidade
de São Paulo.
Pensei (concluí o que já sabia, na verdade) que a cidade de
São Paulo sempre me trouxe a sua imagem. Desde muito cedo, quando você ainda
estava com o Antonio, e íamos todos para aquele velho apartamento no Anhangabaú
passar noites bebendo vodka barata e jogando conversa fora, como uma versão
decadente de um episódio de Seinfeld. O centro de São Paulo me trazia não a
imagem do Antônio ou do Luis (alias, se me viesse a imagem de algum deles,
confesso que talvez eu não soubesse reconhecer qual dos dois era), que eram os
donos do apartamento. Tampouco me trazia a imagem da Isa, que morava em São Paulo
também. Não. São Paulo sempre me lembrou você.
Não sei por que. Você, como eu, não nasceu aqui. Viemos de
fora, subimos a serra com a mochila nas costas (não foi ouvindo Bittersweet
Symphony como você queria, mas são coisas da vida), tentando desesperadamente percorrer
essa distancia entre a vida mundana e repetitiva do Canal 3 e as promessas de
aventura e independência de São Paulo.
Mas, enquanto você recebeu São Paulo com um grande abraço e
um beijo na boca (pegando na bunda e tudo), eu fui receoso. Cheguei, tímido,
andando curvado e assustado por grandes avenidas e viadutos, com medo de ser
engolido por todo esse pavimento. São Paulo me assustava.
Você virou parte da cidade. Cruzava os camelôs e o
trânsito com a maior naturalidade do mundo.
Acho que é por isso que a cidade de São Paulo me trás a sua
imagem. Especialmente o centro. Os prédios de arquitetura antiga, o cheiro
cinza de churrasco barato, os velhos fumando e bebendo no pé da calçada, as
filas nas lotéricas e os elevadores antiquados. Tudo isso me trás você a cabeça,
porque é tudo que, em São Paulo, me fascinava tanto quanto me assustava. De
muitas formas diferentes, eu ainda sou aquele menino da praia, acostumado a
andar quatro quadras para chegar em qualquer lugar, olhando assustado para
todos esses carros e esses prédios, sem entender muito bem como funciona a vida
aqui nessa cidade esquisita. Mas, quando penso em você, e na relação que você
tem com São Paulo, me acalmo. Me trás uma certa paz saber que você entende essa
cidade, que você ama essa cidade, e que você é irremediavelmente parte dela.
Minha relação com São Paulo talvez nunca vá ser perfeita.
Não vejo passando a vontade incontrolável que eu tenho, todas as sextas-feiras,
de pegar o carro e descer a serra. A visão da Avenida Bandeirantes se
sobrepondo a Ricardo Jafet nunca vai me trazer o sorriso no rosto que me trás a
velha escultura do peixe na entrada de Santos. Mas tudo bem. Tudo bem porque,
apesar de todos os nossos problemas, eu e São Paulo aprendemos a nos entender.
Estamos em paz um com o outro. Temos uma amiga em comum.
Feliz aniversario, Ná. =)
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
Houve um Tempo
Houve um tempo em que tudo era mais simples
Os dias eram claros e a noite sempre fria
E era tão facil, tão mais facil
Transformar tristeza em poesia
Houve um tempo em que o amor era mais facil
E cabia todo escrito em uma carta colorida
Com nome assinado, em envelope perfumado
Jogado no armário da minha prometida
Houve um tempo em que tudo o que eu sabia
Era sorrir ou chorar, tudo ou era claro ou escuro
O passado era passado, não brincava de presente
E o presente só queria ser futuro
Houve um tempo com bem menos sentimentos
Memoria era memoria e não era nostalgia
Não se sentia tanta coisa, não se vivia tantas vidas
Só se chorava de tristeza, só se sorria de alegria
Houve um tempo em que tudo era mais simples
Um tempo que passou, faz tempo que passou
E umas palavras velhas rabiscadas num caderno
Foi só o que sobrou
Os dias eram claros e a noite sempre fria
E era tão facil, tão mais facil
Transformar tristeza em poesia
Houve um tempo em que o amor era mais facil
E cabia todo escrito em uma carta colorida
Com nome assinado, em envelope perfumado
Jogado no armário da minha prometida
Houve um tempo em que tudo o que eu sabia
Era sorrir ou chorar, tudo ou era claro ou escuro
O passado era passado, não brincava de presente
E o presente só queria ser futuro
Houve um tempo com bem menos sentimentos
Memoria era memoria e não era nostalgia
Não se sentia tanta coisa, não se vivia tantas vidas
Só se chorava de tristeza, só se sorria de alegria
Houve um tempo em que tudo era mais simples
Um tempo que passou, faz tempo que passou
E umas palavras velhas rabiscadas num caderno
Foi só o que sobrou
quarta-feira, 10 de outubro de 2012
Daqui de Cima
Daqui de cima eu vejo o céu.
Daqui de cima eu vejo o mar, e vejo as pessoas também.
Daqui de cima eu vejo as casas, vejo os morros, vejo os
cachorros e vejo a lua.
Eu vejo tudo, daqui de cima.
Foi o moço de gravata que mandou eu vir praqui pra cima.
E quem mandou ele mandar foi o outro moço, o de terno. Quem mandou no de terno
eu não sei, mas eles passam tudo aqui embaixo, e eu vejo tudo eles passando
daqui de cima. Feito Jesus no corcovado. Só não abro os braço pra num cair.
O pessoal já foi embora da construção, mas eu gosto de
ficar. É gostoso aqui em cima. É bonito ver o sol caindo ali atrás dos prédio
dos patrão, com varanda e piscina. As vezes aparece um ou outro ali por fora,
umas criança, esposa também. Opa, vento. Segura, cuidado pra não cair. Eu que
não morro na contramão, atrapalhando o tráfego.
Já faz um tempão que ta construindo esse prédio daqui.
Quando eu comecei, já tava na metade. Hoje já tem pra mais de dez andar, e ta
subindo, e subindo. Eu comecei vendo o pôr do sol lá de baixo, a construção era
pequenininha. Dava pra gritar lá pro chão que se ouvia. Agora já ta tão alto que
ninguém ouve. Mas eu falo mesmo assim, pra distrair, né? Quando bate vento,
parece que as palavra que eu falo vão com ele. E deixa elas ir pra onde quiser.
Daqui de cima eu vejo o céu.
Daqui de cima eu vejo o mar, e vejo as pessoas também.
Daqui de cima eu vejo as casas, vejo os morros, vejo os
cachorros e vejo a lua.
Eu vejo tudo, daqui de cima.
Tá bonita a vida. Ta legal. Eu tenho esposa, filho
saudável, dinheiro, até apartamento com varanda bonitão que nem esse aqui. Tá
boa a vida. Mas sei lá, chega fim de tarde, sei lá. É o cheiro de alho picado,
eu acho. É, o cheiro de alho picado, de começo de jantar, que fode com a minha
cabeça. Todo fim de tarde. Eu sei que chegou o fim de tarde pelo cheiro do alho
que ela ta picando. E depois o barulho, aquele “sssshhhh” do alho na
frigideira. Bate aquela puta depressão. O cheiro do alho picado anuncia o
começo do fim do dia. Não vai acontecer mais nada. Só o jantar, a novela, e dormir.
E aí amanhã começa tudo igual, puta que o pariu. E esse prédio em construção
aqui em frente, não vai ficar pronto nunca?
Ta foda. Cinquenta e quatro anos. É ano pra caralho. Eu
to velho. Minha vida ta começando a cheirar a alho picado.
Daqui de cima eu vejo o céu.
Daqui de cima eu vejo o mar, e vejo as pessoas também.
Daqui de cima eu vejo as casas, vejo os morros, vejo os
cachorros e vejo a lua.
Eu vejo tudo, daqui de cima.
Não volto pra casa hoje, tem samba. Volto, né, mas volto
tarde. No começo era bom, voltar tarde assim do samba, e só se joga no sofá e
apaga até amanhã. Mas a gritaria dela fez falta. “Safado, Pilantra, um dia vou
te largar e aí tu vai ver!”. E não é que largou mesmo? Desgaçada.
Mas fiquei bem, to indo, to indo. Outro dia acho que vi
ela passando ali embaixo, pequenininha. Não dava pra saber né, é muito alto
aqui. Mas acho que era ela. É, acho que era. Pelo sim, pelo não, mandei um “te
amo, mulher”, bem baixinho, contra o vento, pra ver se chegava nela, mas num
chegou. Se chegou, ela não olhou aqui pra cima. Mulher ruim dos inferno, homem
não pode chora. Não pode chora não, não pode.
Daqui de cima eu vejo o céu.
Daqui de cima eu vejo o mar, e vejo as pessoas também.
Daqui de cima eu vejo as casas, vejo os morros, vejo os
cachorros e vejo a lua.
Eu vejo tudo, daqui de cima.
“Ssssshhh”. Meia hora. Meia hora e o jantar vai ta
pronto. E eu vou comer, ver a novela, e eu vou dormir. E aí acabou tudo. Meia
hora, porra. Meia hora. Cheiro de alho filho da puta, pra onde você levou meu
dia?
quinta-feira, 27 de setembro de 2012
Pipoca
- PUTA QUE O PARIU, EU AVISEI QUE IA DAR MERDA – Disse o
homem das cavernas para o amigo, quando o primeiro milho explodiu em uma
misteriosa e macia bolinha branca.
-CARALHO, CARALHO, QUE PORRA É ESSA? – Gritava, em
resposta, o outro, enquanto mais e mais bolinhas brancas pipocavam do fogo.
Saíram os dois correndo, e ficaram observando, de trás da
árvore.
-Vai lá ver, acho que parou. – Disse um deles, depois de
um tempo.
-Vai você, a ideia foi tua.
Cuidadosamente, o homem, peludo e pelado, foi até perto
da fogueira. Várias das bolinhas brancas estavam espalhadas em volta do fogo. Com
cuidado, pegou uma na mão.
-E aí? – Gritou o outro, de trás da árvore.
-É macio. Vem ver.
O outro chegou perto e ficou olhando.
-Come.
-Pra puta que te pariu. Come você.
-A ideia foi tua. Agora a gente ta sem milho e sem
comida. Come, vê se é de comer.
O outro hesitou, depois disse – Não tem cara de ser de
comer.
- As vezes é, pô. Come logo.
-Se der merda...
-Não vai dar merda, come essa porra!
O homem fechou os olhos e colocou a bolinha na boca.
Mastigou de olhos fechados por um tempo, depois disse:
-Falta sal.
-O que?
-Nada, deixa quieto. Da pra comer sim, pega uma. – E ofereceu
outra, do chão, para o amigo.
-É, é de comer mesmo.
Comeram em silêncio por um tempo. Depois, o primeiro
falou:
-Porra, que esquisito.
-Não é? Te faz pensar...Deve ter tanta coisa boa pra
comer aí que a gente ainda não descobriu...
Silêncio por mais um tempo. O outro fala:
-E aquela gosma branca que sai da teta dos bichos, será
que da pra beber?
-Porra, tu é nojento pra caralho, hein? – Disse o outro,
e foi embora inventar o sal.
terça-feira, 18 de setembro de 2012
Campeão
A porta se
escancara e os dois entram, entrelaçados, aos tropeços. Ela empurra seu corpo
para a cama com violência, tira a blusa e deita em cima dele. Marcelo vira
rapidamente seu corpo, de modo a ficar por cima, e sussurra em seu ouvido: - O
que você quer?
Isabela responde – Quero você. – Enquanto tenta tirar a
camisa dele.
-Quer o que de mim? Fala, vai. – Marcelo sussurra bem
baixo no ouvido dela.
-Quero que você faça amor comigo. Quero fazer sexo com
você.
-Tem certeza? – Marcelo agora levanta o rosto, de modo a
olhar nos olhos de Isabela.
-Sim, tenho certeza.
-Você quer fazer sexo comigo?
-Quero, Marcelo, vem, eu quero fazer sexo com você.
Marcelo para de se mexer. Calmamente, ele rola para o
lado, se afastando de Isabela, e começa a se levantar. Finalmente, fica em pé
na cama. Isabela nota que ele está chorando.
-CONSEGUI, PORRA!
-O que? – Isabela começa, mas não chega a terminar. A porta
do armário se abre, e vários homens saem de lá de dentro.
- MEU DEUS! MARCELO, QUEM SÃO...Edu? Chico? – Isabela nota
que são antigos amigos, da época de colegial dela e de Marcelo.Todos tem a
mesma expressão no rosto, de emoção, de conquista. Alguns choram.
- Gente, - Começa Marcelo, de cima da cama - eu queria
agradecer muito a todos vocês por estarem aqui. É uma honra dividir esse momento.
Dudu, Johnny, Ervilha, Panco, vocês nunca duvidaram de mim. Sempre souberam que
eu ia chegar lá.
Os homens aplaudem, dão vivas. Alguém tira um rádio de
bolso do casaco e a música tema de Rocky começa a tocar.
-Marcelo, o que está acontecendo?
-Essa conquista não é só minha. É de todos vocês. De
você, Dudu, que comprou um álbum do Creed uma vez, só pra tentar impressionar a
Angélica. Ervilha, que roubou o terno Armani do pai e ficou quatro horas no
supermercado, pra depois fingir que encontrou a Letícia por coincidência. Essa
noite é pra todos aqueles que sonharam em comer a gostosa do colegial. O sonho
é possível, o sonho é real. Vocês ouviram, ela falou “eu quero fazer sexo com
você.” – E depois, de novo, reforçando o “você” – EU QUERO FAZER SEXO COM VOCÊ!”
Aplausos, vivas. Johnny pula na cama e derruba Marcelo
com um abraço, gargalhando de emoção. Dudu comenta, limpando as lágrimas – Ele merece,
ele merece...
- Eu não sei que tipo de palhaçada está acontecendo –
Isabela começa, recolhendo suas roupas – mas você não ganhou nada. Nada, ta entendendo?
Eu não fiz sexo com você, e eu nunca vou fazer sexo com você, Marcelo!
Mas eles não estão mais ouvindo. Alguém desencavou uma
faixa de “CAMPEÃO”, e agora Ervilha e Panco colocam Marcelo no ombro de Dudu,
para receber a faixa. Ao sair pela porta, Isabela ainda consegue ouvir os
gritos de MAR-CE-LO, MAR-CE-LO, e vai embora, já com meia cabeça formada pra
virar lésbica.
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