Ontem, saindo da estação Santa Cecília do metrô, a caminho de
sua casa nova, pensava em duas coisas. Uma delas era você. A outra era a cidade
de São Paulo.
Pensei (concluí o que já sabia, na verdade) que a cidade de
São Paulo sempre me trouxe a sua imagem. Desde muito cedo, quando você ainda
estava com o Antonio, e íamos todos para aquele velho apartamento no Anhangabaú
passar noites bebendo vodka barata e jogando conversa fora, como uma versão
decadente de um episódio de Seinfeld. O centro de São Paulo me trazia não a
imagem do Antônio ou do Luis (alias, se me viesse a imagem de algum deles,
confesso que talvez eu não soubesse reconhecer qual dos dois era), que eram os
donos do apartamento. Tampouco me trazia a imagem da Isa, que morava em São Paulo
também. Não. São Paulo sempre me lembrou você.
Não sei por que. Você, como eu, não nasceu aqui. Viemos de
fora, subimos a serra com a mochila nas costas (não foi ouvindo Bittersweet
Symphony como você queria, mas são coisas da vida), tentando desesperadamente percorrer
essa distancia entre a vida mundana e repetitiva do Canal 3 e as promessas de
aventura e independência de São Paulo.
Mas, enquanto você recebeu São Paulo com um grande abraço e
um beijo na boca (pegando na bunda e tudo), eu fui receoso. Cheguei, tímido,
andando curvado e assustado por grandes avenidas e viadutos, com medo de ser
engolido por todo esse pavimento. São Paulo me assustava.
Você virou parte da cidade. Cruzava os camelôs e o
trânsito com a maior naturalidade do mundo.
Acho que é por isso que a cidade de São Paulo me trás a sua
imagem. Especialmente o centro. Os prédios de arquitetura antiga, o cheiro
cinza de churrasco barato, os velhos fumando e bebendo no pé da calçada, as
filas nas lotéricas e os elevadores antiquados. Tudo isso me trás você a cabeça,
porque é tudo que, em São Paulo, me fascinava tanto quanto me assustava. De
muitas formas diferentes, eu ainda sou aquele menino da praia, acostumado a
andar quatro quadras para chegar em qualquer lugar, olhando assustado para
todos esses carros e esses prédios, sem entender muito bem como funciona a vida
aqui nessa cidade esquisita. Mas, quando penso em você, e na relação que você
tem com São Paulo, me acalmo. Me trás uma certa paz saber que você entende essa
cidade, que você ama essa cidade, e que você é irremediavelmente parte dela.
Minha relação com São Paulo talvez nunca vá ser perfeita.
Não vejo passando a vontade incontrolável que eu tenho, todas as sextas-feiras,
de pegar o carro e descer a serra. A visão da Avenida Bandeirantes se
sobrepondo a Ricardo Jafet nunca vai me trazer o sorriso no rosto que me trás a
velha escultura do peixe na entrada de Santos. Mas tudo bem. Tudo bem porque,
apesar de todos os nossos problemas, eu e São Paulo aprendemos a nos entender.
Estamos em paz um com o outro. Temos uma amiga em comum.
Feliz aniversario, Ná. =)
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