Vamos morrer.
Vamos todos morrer, e eu não quero soar como uma pessoa
triste, ou o passageiro de um avião cuja asa acabou de ser decepada por um
raio, mas vamos todos morrer.
Digo que não quero soar como uma pessoa triste porque o
mero ato de morrer, em si, não pode ser uma coisa triste ou feliz. Falta ponto
de comparação.
Dizemos que uma lasanha é boa e, subentendido, está o
fato de que ela é boa comparada a outras lasanhas, ou, se você tem uma visão
mais abrangente do mundo, outras comidas de origem italiana.
Mas não existe ponto de comparação para a morte. Morrer é
ruim em relação a o que? Viver? Vive-se baseado na morte. Não existe vida que
não termine com a morte (não discutirei zumbis nesse texto, não insistam),
portanto, não podemos dizer que a vida que termina em morte é boa ou ruim.
O que podemos dizer, no entanto (e, no caso, eu estou
dizendo), é que morrer é angustiante. É angustiante no sentido que nos trás uma
dualidade cruel, de um tipo que não estamos preparados para lidar.
Morrer transforma a vida em um paradoxo.
Explico: A morte, a partir do momento em que se torna parte
da vida (ou seja, a morte sendo a morte. Desculpe, eu não sei porque alonguei
essa frase), transforma-a (a vida) simultaneamente, em algo ridiculamente
desprovido de valor e na coisa mais valiosa do mundo.
Explico mais um pouco: Sob a ótica da morte, viver
qualquer tipo de vida não faz o menor sentido. Trabalhar, casar, ter filhos...
Ou o polo oposto: não trabalhar, beber, morar na rua, alimentar-se de sol, sei
lá... Tudo isso perde o propósito sob a ótica do “não-existir”, de forma que
tudo o que fazemos é irrelevante. E esse fato carrega consigo uma infinita
liberdade.
Explico mais um pouquinho (ta acabando): Por outro lado,
o fato de que só vivemos uma vida e não haverá vida após essa vida (e, mesmo se
houver, você vai ser uma pessoa completamente diferente e não vai lembrar da
sua vida anterior: ou seja, não é você, ou seja: não existe vida após essa
vida, ou seja: eu estava certo) faz com que toda e qualquer atitude tomada
tenha um valor inestimável. Só temos essa vida, só temos esse período de tempo,
só temos esses recursos, e, por mais que tudo seja varrido para o esquecimento
no momento de nossa última respiração, agora, neste segundo, a vida tem um
valor infinito.
Devemos, então, viver cada segundo como se fosse o
último? Aproveitar nossa vida pois não sabemos o dia de amanha? Viver em uma
espiral hedonista eterna, sem a menor consideração pelos sentimentos daqueles a
nossa volta e do mundo em que vivemos, porque, francamente, depois que eu
morrer nada mais importa, então o mínimo que essa vida indiferente me deve é a
possibilidade de entorpecer-me de sentimentos e alegrias fugazes?
Ou, por outro lado, devemos construir cada momento na consciência
de que existirá um momento após aquele, e outro após aquele, cuidadosamente
construindo nossa casa de cartas, que, sabemos, dia mais dia menos, será
carregada pelo vento, mas que, enquanto o vento não bater, nos proverá abrigo e
proteção?
A resposta, obviamente, é que foda-se.
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