“Sabe, eu gosto de pensar que um dia a gente se encontra
de novo,”
Foi assim que ela começou a despedida, você acredita?
Piegas como uma letra de música da Disney. E não falo nem das músicas
principais, falo dos temas de “O Retorno de Jafar”, ou “O Reino de Simba”.
Aqueles que ninguém viu, cujos nomes eu só conheço porque ela adorava tudo que
era da Disney, e me fazia ver junto.
“...um dia, em algum lugar do universo.”
E o mesmo papinho de universo, de estrelas, galáxia. Taí
uma coisa que eu não vou sentir falta. Essa babaquice de átomos, prótons, nêutrons,
o cacete a quatrons. Papo chato.
“Porque, pensa comigo, amor...”
E me chama de amor. Pode, uma coisa dessas? Em pleno fim
de namoro?
“Eu e você, nós somos átomos. Em essência, não somos? A
matéria é composta de átomos, e nós somos matéria. Então eu e você somos átomos.”
Olha lá, falei que ia chegar no papo de átomos! Não
passava uma semana sem falar nisso, a chata. E eu ouvia, o pior é isso.
“E o tempo é infinito, amor, apesar de o nosso não ter
sido. E um dia você vai morrer, e eu também, e a Terra também.”
Sente o drama.
“E vão passar anos, décadas, séculos, milênios, e tudo o
que valia a pena ser lembrado vai ser esquecido, porque não vai ter ninguém pra
lembrar. Inclusive a nossa história.”
Vai vendo, vai vendo. Essa mulher é foda.
“A queda do muro de Berlim e o nosso primeiro beijo. O
onze de setembro e nosso aniversário de namoro. A Mona Lisa e a nossa música
favorita. Tudo vai morrer, e vai morrer duas vezes. Vai morrer porque vai
deixar de existir, e vai morrer de novo porque ninguém vai lembrar que existiu.
Nem eu. Nem você.”
E eu aqui, querendo acabar a carta logo pra ir jogar bola
com os amigos. Ela sempre foi prolifixa. Profilixa. Proxilifica. Ah, foda-se,
ela sempre falou pra caralho.
“Mas os nossos átomos vão continuar por aí. Os meus e os
seus. E, sabe, eu gosto de pensar... Com o tempo sendo infinito como é, todos
os átomos vão se juntar de todas as formas possíveis, infinitas vezes. E sim,
isso quer dizer que em algum momento da história os átomos que compõe a sua
cara vão se juntar com os átomos que compõe a bunda da Jennifer Lopez para
formar, sei lá, um meteorito, mas o ponto não é esse.”
Engraçadinha.
“O ponto é que... Estatisticamente falando, um dia os
seus átomos vão encontrar os meus de novo. Em algum lugar do universo, alguns
bilhões de trilhões de anos no futuro. Todos os átomos que hoje fazem de você quem
você é, e todos os que fazem de mim quem eu sou, um dia vão se juntar, em uma
supernova, um planeta, uma pedra, qualquer coisa. Talvez uma estrela cadente no
céu de um planeta estranho, em uma galáxia tão longe, mas tão longe que a gente
nem sabe que existe ainda.
E ali, naqueles dois ou três segundos em que a gente vai
voltar a existir juntos no mesmo espaço e tempo, eu gosto de pensar que a gente
vai se reconhecer. Eu gosto de pensar que, contra todas as probabilidades,
naqueles três segundos em que os meus átomos encontrarem os seus e se abraçarem
e riscarem o céu desse qualquer lugar estranho do outro lado do universo,
alguma voz, de algum lugar, vai sussurrar “ei... eu conheci você. Um dia. Um
dia a gente foi feliz”, e tudo vai ser como era antes, pelo menos por um tempo.
E vai ficar tudo bem. Pra sempre. Porque nada se perde de
verdade, tudo se transforma e volta e recomeça de onde parou. O universo sabe o
que faz. Vê se fica bem, tá? Eu te amo. Não esquece do nosso encontro do outro
lado do universo. Eu te amo.”
Falei? Fala pra cacete. Foda. Deixa eu ligar pros broder
e falar que não vou, porque jogar bola com os olho inchado não rola.
Essa mulher é foda.