Era uma vez uma rainha muito, muito bela, porém, muito
triste. Ela era senhora de todo um reino grande e vasto e sua beleza causava
inveja em todas as mulheres e desejo em todos os homens, porém, ela não podia
ser feliz. Acontece que esta rainha sofria de uma séria condição mental, que só
foi diagnosticada e classificada muito anos depois de sua morte, chamada
Transtorno de Personalidade Narcisista. A pobre rainha era terrivelmente
insegura, e lhe causava imenso mal estar e tristeza pensar que alguém poderia
ser mais bonita que ela. Ela precisava ser a mulher mais bonita de seu reino,
era a única forma de conseguir ser feliz. Olhava as pessoas comuns, fazendo
compras, andando pelas ruas, e pensava: “Porque
eu não posso ser assim? Porque eu não posso ser feliz com o que sou? Porque eu
preciso ser vista como a mais bela de todas, para não chorar todas as noites?”
Ela não sabia que era uma pessoa doente, por isso, nunca soube que esses
pensamentos não eram sua culpa.
Grande parte do sofrimento desta rainha era culpa de uma
garota que vivia em seu reino, Branca de Neve. Branca de Neve era a única
mulher mais bonita que a rainha, em todo o reino. E, apesar de estar plenamente
consciente da deficiência de sua rainha, Branca de Neve insistia em exibir sua
beleza aonde quer que passasse, seduzindo os homens, andando em roupas
provocativas, fazendo o possível para aparecer mais do que a rainha, apesar de
não sofrer da mesma horrível condição mental que sua rival. Por anos, a rainha
aguentou calada, chorando noites sem fim por seu destino cruel, porém, sem
nunca tentar nada contra Branca de Neve, apesar do tanto que sofria por conta dela.
Um dia, em uma crise horrível de ciúmes e tristeza, a rainha não aguentou mais,
e, cansada de viver lutando contra sua mente perturbada, mandou matar Branca de
Neve. Para isso, enviou seu único amigo do reino (afinal, as pessoas tinham
medo de se aproximar da “rainha louca”), um caçador das redondezas.
Qual não foi a decepção da rainha quando descobriu que a única
pessoa que podia confiar, o único amigo que teve no reino (ao contrário de
Branca de Neve, que era muito popular), traiu sua confiança, e não matou Branca
de Neve? Branca de Neve havia, por conta própria, levado sua relativamente
controlável condição mental a completa loucura, fazendo com que a rainha
cometesse atos que outrora considerava impensável, como assassinato, e, além
disso, seduzira e roubara o único amigo que a rainha jamais tivera em todos os
seus tristes anos de vida.
Completamente perturbada, a rainha descobre que Branca de
Neve está vivendo escondida, na floresta (mas não sem a companhia de sete “amigos”,
que dividem a casa com ela), e, desesperada, resolve fazer um feitiço para
transformar-se numa velha vendedora de frutas, para, assim, entregar uma maça
envenenada para Branca de Neve, e, em seu delírio, finalmente conseguir ser
feliz (fica claro, neste ponto da história, que Branca de Neve já havia levado
a relativamente sã rainha a completa demência, pois em nenhum momento lhe
ocorreu que, mesmo matando a garota, a rainha continuaria sendo uma velha
horrível, e, nem de longe, a mulher mais atraente do reino).
Mas a pobre história de desgraça e traição da rainha não
acaba aí. Seu plano para tirar de vez Branca de Neve se sua vida e poder
finalmente ser feliz falha, pois Branca de Neve, ao invés de morrer, apenas cai
em um sono profundo (da qual é rapidamente tirada por, que surpresa, mais um
homem). Delirante e doente, a rainha vai embora gritando e cantando frases sem
sentido, mas nem assim pode ter paz. Os sete amigos de Branca de Neve a
encontram, andando sem rumo pela floresta, e, ao invés de levarem-na para um
hospital ou casa de repouso, perseguem-na implacavelmente até um penhasco.
Completamente louca, destruída e corrompida pela tristeza e pela culpa,
horrivelmente deformada por seu feitiço, a uma vez bela e feliz rainha cai para
o abismo em direção ao triste fim que lhe foi reservado por Branca de Neve, que
viveu feliz para sempre por muitos e muitos anos com seu príncipe e seus amigos
assassinos, sem nunca olhar para trás ou se arrepender pelas coisas que fez com
sua rainha.
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